STJ: O juiz de direito da Justiça Militar pode inquirir diretamente as testemunhas, visto o CPPM ter adotado o sistema presidencialista de inquirição

STJ. 6ª Turma. REsp 1.977.897-MS, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 10/9/2024 (Info 825).

STJDIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL MILITAR

12/4/20245 min read

O juiz de direito da Justiça Militar pode inquirir diretamente as testemunhas, visto o Código de Processo Penal Militar ter adotado o sistema presidencialista de inquirição.

RECURSO ESPECIAL E AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DIREITO PENAL MILITAR E DIREITO PROCESSUAL PENAL MILITAR. CONCUSSÃO EM SERVIÇO (EDEVALDO) E CONTRABANDO DE CIGARROS (WELITON). RECURSO ESPECIAL DE WELITON. VIOLAÇÃO DOS ARTS. 212, CAPUT E PARÁGRAFO ÚNICO, DO CPP; 311 E 312, AMBOS DO CPPM; 1º E 334-A, AMBOS DO CP; E 102 DO CPM. ALEGAÇÃO DE NULIDADE DO DEPOIMENTO DAS TESTEMUNHAS DE ACUSAÇÃO POR CONTA DO MAGISTRADO TER INICIADO AS PERGUNTAS. TESE DE VIOLAÇÃO AO SISTEMA ACUSATÓRIO VIGENTE. NÃO OCORRÊNCIA. IDÔNEA APLICAÇÃO DO VIGENTE ART. 418 DO CPPM. INVIABILIDADE DE APLICABILIDADE SUBISIDIÁRIA DO CPM DIANTE DA EXPRESSA PREVISÃO LEGAL. ART. 3º DO CPPM. VIOLAÇÃO DOS ARTS. 1º E 334-A, AMBOS DO CP. CARÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO QUE PERMITA A EXATA COMPREENSÃO DA CONTROVÉRSIA. SÚMULA 284/STF. PLEITO DE DECOTE DA PENA DE PERDA DO CARGO. PROVIMENTO. EFEITO NÃO AUTOMÁTICO DA CONDENAÇÃO. JURISPRUDÊNCIA DO STJ. AUSÊNCIA DE PROCEDIMENTO ESPECÍFICO PELO TRIBUNAL COMPETENTE, NOS TERMOS DO ART. 125, § 4º, DA CF. EXTENSÃO DE EFEITOS DA DECISÃO AO CORRÉU. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL DE EDEVALDO. IMPUGNAÇÃO DEFICIENTE DA DECISÃO DE INADMISSÃO NA ORIGEM. INOBSERVÂNCIA DO COMANDO LEGAL INSERTO NOS ARTS. 932, III, DO CPC/2015, E 253, PARÁGRAFO ÚNICO, I, DO RISTJ.

1. Recurso especial de Weliton. Quanto à aludida tese da nulidade do depoimento das testemunhas de acusação por conta de o magistrado ter iniciado as perguntas ? violação ao sistema acusatório vigente, extrai-se do voto condutor do combatido aresto os seguintes fundamentos (fls. 902/903):
Diversamente do que pondera a defesa, a inquirição das testemunhas guardou estrita observância à norma aplicável ao processo penal militar, qual seja o artigo 418 do Código de Processo Penal Militar.
[...] Tem-se que a norma preceituada no art. 418 do Código de Processo Penal Militar é taxativa em regulamentar o sistema presidencialista de inquirição, no qual o Juiz auditor pode inquirir diretamente as testemunhas, exercendo ainda a função de intermediar os questionamentos realizados pelos Juízes militares, procuradores, assistentes e advogados das partes. [...], considerando tratar- se de delitos militares, não há que se falar em aplicação subsidiária do artigo 212 do Código Penal.

2. O fundamento aplicado pela Corte de origem não merece reparos, haja vista a Lei n. 11.690/2008 que alterou a redação do art. 212 do Código de Processo Penal não ter alterado a redação do art. 418 do Código de Processo Penal Militar. Não há ilegalidade na adoção do sistema presidencialista de inquirição de testemunhas pela Justiça castrense.

3. Houve estrita observância à regra insculpida no art. 418 do Código de Processo Penal Militar, o qual, encontra-se válido e regulamenta o sistema presidencialista de inquirição, em que o Juiz auditor pode inquirir, diretamente, as Testemunhas, exercendo, ainda, a função de intermediar os questionamentos realizados pelos Juízes Militares, procuradores, assistentes e advogados das partes, não havendo, notadamente diante da existência de comando expresso, falar em aplicação subsidiária do Código de Processo Penal.

4. Havendo regulamentação expressa no Código de Processo Penal Militar, relativa ao poder de inquirição do Juiz auditor, inviável a aplicabilidade subsidiária do Código de Processo Penal, haja vista a exegese do art. 3º do CPPM, que disciplina que somente os casos omissos devem ser supridos pela legislação de processo penal comum.

5. Ainda que assim não o fosse, segundo a jurisprudência desta Corte, continua sendo possível ao magistrado indagar as testemunhas durante a instrução, diante do impulso oficial do processo. Com efeito, a jurisprudência desta Corte de Justiça, no sentido de que a inquirição das testemunhas pelo Juiz, antes que seja oportunizada às partes a formulação das perguntas, com a inversão da ordem prevista no art. 212 do Código de Processo Penal, constitui nulidade relativa, que exige a demonstração do efetivo prejuízo, conforme o disposto no art. 563 do mesmo Estatuto, para que seja alcançada a anulação do ato (AgRg no RHC n. 148.274/SC, Rel. Ministra LAURITA VAZ, Sexta Turma, julgado em 15/6/2021, DJe 25/6/2021) - (AgRg no HC n. 787.903/SP, Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, DJe de 19/12/2022).

6. No que se refere à violação dos arts. 1º e 334-A, ambos do CPP, diante da carência de devida fundamentação, a qual não permite a compreensão de como os dispositivos infraconstitucionais citados foram violados, deve incidir o óbice da Súmula 284/STF, que impede o conhecimento do recurso especial.

7. Em relação à violação do art. 102 do CPM o Tribunal de origem apresentou os seguintes fundamentos (fls. 941/944): a norma inscrita no art. 102 do Código Penal Militar, que prevê, como pena acessória, a exclusão da praça quando a esta fora imposta sanção privativa de liberdade, por tempo superior a 02 anos, não mais subsiste em face, precisamente, da cláusula fundada no § 4º do art. 125 da Constituição Federal, que torna exigível decisão do Tribunal competente, a ser proferida em processo específico. [...], considerando o caso dos autos, em que os condenados integram o círculo de praças da Polícia Militar Estadual, concluo que a exclusão dos quadros da instituição é efeito automático da própria sentença penal condenatória, sendo de rigor a manutenção.

8. Para a jurisprudência desta Corte Superior, a perda do cargo não é efeito automático da decisão. A propósito: [...] De acordo com a pacífica jurisprudência desta Corte Superior, a perda do cargo não é efeito automático da condenação e depende de fundamentação específica na sentença (AgRg no AREsp n. 2.390.294/MG, Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, DJe 15/2/2024).

9. O procedimento adotado não seguiu a liturgia necessária para tal disposição condenatória, porquanto, ainda que as penas privativas de liberdade tenham ficado em patamares superiores a 2 anos de reclusão, tem-se que a perda da graduação de praça da corporação somente pode ser decretada por decisão do tribunal competente, devidamente fundamentada e mediante procedimento específico, nos termos do art. 125, § 4º, da Constituição Federal, o que não se verifica na hipótese dos autos.
Dessa forma, impõe-se o decote da referida pena acessória, com extensão efeitos ao corréu.

10. Quanto ao agravo em recurso especial de Edevaldo, não há o preenchimento dos requisitos de admissibilidade, haja vista, no caso dos autos, o agravante não ter impugnado, de forma suficiente, o fundamento da decisão de inadmissão.

11. Recurso especial de Weliton Arce Espíndola parcialmente conhecido e, nessa extensão, provido, em parte, com extensão de efeitos ao corréu.

Agravo em recurso especial de Edevaldo Aleixo Marques Fontes não conhecido.

STJ. 6ª Turma. REsp 1.977.897-MS, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 10/9/2024 (Info 825).